terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Como parecer (e até ser) um executivo de sucesso

Ou "coisas que você não vai ler na Você SA":

"O jargão é meu pastor e nunca me faltará." Jamais se esqueça deste mantra. Quando não tiver o que dizer, fale coisas como: "a empresa está em busca de sinergias dentro da sua cadeia produtiva, para que a reprecificação dos ativos não impacte na sustentabilidade empresarial da sua relação com os diversos stakeholders." Não quer dizer nada (na verdade, a empresa está quase quebrada), mas ninguém questionará.

Para valorizar aquele seu MBA no exterior, use sempre palavras em inglês corporativo, mesmo quando (principalmente se) tiver equivalentes em português e todos os interlocutores forem brasileiros, ou falarem português. Diga que você precisa de um overview do briefing, para poder fazer um draft do layout para entregar ao prospect a tempo de ainda marcar um conference call e fazer uma review, que faz parte da sua checklist. Se estiver tired, bored ou stressed, peça para tirar um break ou um day off, whatever... No fim, peça sempre um feedback e verifique se o benchmark foi atingido. Este blogueiro mesmo escreve posts e não postagens, pois quer aparecer nos trending topics. Exagere na pronúncia: nada de falar "tuíter", diga "tuírerr", quando se referir à rede social.

Sempre que um subordinado chegar com uma ideia, interrompa-o e sugira algo que não tem nada a ver sobre qualquer outro assunto, como quem diz "eu queria mesmo falar com você sobre isso". Você vai passar a impressão de um chefe envolvido com os problemas e democrático, quando, na verdade, só continua impondo as suas ideias, por mais bizarras que sejam.

Interrompa o trabalho dos seus subordinados todos os dias para dar orientações sobre a função que ele já desempenha diariamente, como se fossem uma novidade. Isso fará todos (inclusive ele) acharem que só você domina aquele trabalho medíocre, que você é fundamental para comandar sua equipe, além de um grande líder, e evitará que seu subalterno se sinta seguro em sua função.

Fale com convicção o que quer que seja, ainda que seja um assunto sobre o qual você não tem qualquer informação. Aparente conhecimento é poder.

Vá até a impressora na hora em que o seu subordinado tiver acabado de mandar imprimir aquela passagem para Guarapari na Semana Santa, chegue na impressora antes dele e faça cara de cumplicidade, estilo chefe legal (ou: "eu sei que você usa os recursos da empresa para fins pessoais"). Isso garantirá a você extrair algumas horas-extras não remuneradas dele.

Almoce na sua mesa de trabalho. Você não veio ao mundo para dar tranquilidade a ninguém. Não vai ser na sua hora de almoço que você vai descer para dar uma hora de descanso aos seus subordinados para eles poderem entrar no Facebook ou mandarem e-mails pessoais em paz.

Pergunte ao seu subordinado se ele está bem sempre que ele ficar mais de cinco minutos longe da mesa dele. Ele terá certeza de que você está controlando tudo o que ele faz (e está), mas você ainda passará a imagem de que está preocupado com a vida pessoal da equipe.

Leve seu(s) filho(s) um dia no trabalho. (Se não tiver um, leve o cachorro.) Será divertido ver aquele monte de gente medíocre, de 30 a 40 anos de idade e abaixo de você, puxando o saco e querendo agradar um moleque sem educação de menos de 10 anos de idade.

Inventar palavras em inglês ou aportuguesar as estrangeiras, mesmo quando elas já existem em português, também está valendo. Diga sempre que você vai "estartar" alguma coisa, não simplesmente "começar", mesmo que esteja falando do seu almoço, e que você "suporta" tal ideia, quando você deveria dizer apenas que apoia ou concorda. Mas, para valorizar seu MBA, diga que você se viciou nessas expressões. Para parecer que você se importa com a compreensão, faça sinal de "aspas" no ar com os dedos da mão a cada vez que falar em itálico.

Dê incertas na mesa dos seus subalternos. Os melhores momentos são quando ele estiver sorrindo para a tela do computador. Provavelmente, ele acabou de ler algo engraçado no Facebook (ou no Blog do Jorge). O constrangimento dele fará sua semana valer a pena.

Ocupe seus subordinados com serviços medíocres, sempre como se fossem "missões" importantíssimas para a empresa. Mantê-los ocupados e falsamente valorizados diminui riscos e te dará a sensação de segurança no cargo de que você tanto precisa.

Não esqueça: gritar está fora de moda (além de render processos). Falar baixinho é o novo terno (ou tailleur) do mundo corporativo. A humilhação discreta e diária (e sem registros) é muito mais poderosa.

Não seja um chefe antiquado. Nada de falar "recursos humanos", "assessoria de imprensa". "Departamento pessoal", ou "depê", então, nem pensar. É atestado de pobreza (e de velhice). O último, na verdade penúltimo, grito do alpinismo social é falar também as siglas em inglês, portanto PR ("pí-árr"), HR ("êitch-árr") para RH, e por aí vai. O mesmo vale para e-mails: encaminhe mensagens dos superiores sem acrescentar nada, apenas um "fyi" no subject. Se for escrever algo longo (cinco palavras), comece com "btw" e termine com "asap".

Finja cordialidade sempre. Assim, você poderá fazer aquele pedido absurdo a cinco minutos do horário de saída do seu funcionário e dizer "eu não queria te pedir isso a essa hora, mas estão me cobrando". (A falsa cumplicidade a seu serviço, mais uma vez.)

Adicione seus subordinados no Facebook.

Marque reuniões para não resolver nada. Uma por semana, no mínimo. E pelo menos um conference call (inglês, lembra?) por dia com a mesma finalidade.

Na dúvida de quais palavras usar? Escolha uma de cada coluna e fale na ordem.

Apareça informal (bermuda cáqui e camisa polo, pois é assim que chefe se veste informalmente) sem querer no bar que os seus subordinados costumam frequentar de forma que seja impossível eles não se sentirem obrigados a te convidar para se juntar a eles.

Faça comentários sobre a roupa dos seus subordinados. Não deixe claro se é uma crítica ou um elogio (até porque o primeiro poderia ser considerado assédio moral e o segundo, sexual, e nós não queremos que você seja processado por práticas tão antiquadas). Use referências vagas, como "hmmmmm... Camisa azul, hein?". Isso ajudará a manter o clima de insegurança (para os outros) no ambiente.

Sempre diga ao seu subordinado o que você está fazendo, num tom supostamente educativo, mas sempre deixando claro que você só está fazendo aquilo porque ele não fez.

Passe o dia no telefone, e dê gargalhadas altas de vez em quando. Além de te tornar inacessível, deixará os outros loucos, fará parecer para os seus superiores que você é um grande gestor, comandante do melhor clima de trabalho da empresa. Para os subordinados, bem, quem liga para eles? Quando um deles chegar perto, para tentar participar do assunto, feche a cara.

Use sapatos silenciosos. Eles serão úteis quando você for chegar discretamente por trás do seu subordinado e ele(a) estiver falando com a(o) namorada(o). A vergonha e a culpa do coitado te permitirão pedir (com cara de fofinho, claro) que ele estenda as 12 horas de trabalho diárias dele.

Mantenha o ar misterioso ao seu redor. Ser indecifrável passará a ideia de que você tem um "algo a mais" que te fez chegar lá.

Comente algum post recente de algum dos seus subordinados no Facebook ou no Twitter para todos na segunda-feira. Isso dará certeza de que você passou o fim de semana vasculhando a vida dele.

No caso de uma empresa que não separa os eleitos como você em salas de vidro, ou no andar que corresponda à sua casta, mexa-se na cadeira (escolha uma bem barulhenta) repentinamente e várias vezes ao dia. Será engraçado ver seus funcionários criando tiques nervosos ou aprendendo a usar o Alt+Tab, achando que você está indo falar com eles.

Demita alguém que todos julguem ser um bom funcionário, sem explicar o motivo a ele ou aos demais (atribua sempre a uma "readequação dos quadros", ou a "desempenho", de uma forma subjetiva, ou algo que o valha). A insegurança e a baixa autoestima de quem está abaixo de você são as chaves da manutenção do seu poder.

Pare o serviço de todos para comentar sobre um filme que você viu (ou não, mas finja que viu), e sobre sua última viagem para a Costa do Sauípe, ou o último fim de semana em Nova York, como se todos fossem íntimos dos lugares que você visita (ou diz que visita).

Quando um subordinado falar alguma coisa, comece a falar por cima com cara de "você está falando uma enorme besteira" e diga EXATAMENTE a mesma coisa que ele estava falando.

Cargos? Só em inglês também. Afinal, você não quer ser "presidente", ou simplesmente "dono" do botequim, ou da papelaria da esquina. Você é CEO (pronuncia-se "siôu"), você não tem contador, mas "siéfôu" (CFO) e um dia ainda vai fazer um "ái-pi-ôu" (IPO), não simplesmente "abrir capital".

Refira-se aos chefes supremos da empresa pelo primeiro nome ou um apelido. Vai fazer parecer que você é íntimo até de Deus.

Peça algo ao seu subordinado assim que ele chegar (no começo do dia e após a hora de almoço), de preferência sem dar "bom dia". A estratégia é não deixar ninguém abaixo de você ter tempo para pensar, respirar ou criar, lembra? E sempre passar a impressão de que os outros não estão fazendo nada.

Deixe espalhados na sua mesa cartões de outros "CEOs" (cargos em inglês, lembra?). (Se não tiver esses cartões, imprima alguns, falsifique.) Todos vão achar que, além de importante, autoritário e escroque, você é bem relacionado.

Sempre que pedir algo, comece com um "você está ocupado(a)?". Passará sempre duas impressões importantes. A primeira é de que você se importa. E a segunda, e mais importante, é a de que ninguém além de você faz nada na empresa. Faça parecer que já era para ele(a) ter adivinhado e ter te entregue o que você pediu.

Quando alguém se aproximar para perguntar ou dizer alguma coisa, finja que não está ouvindo, mexa no Blackberry (ou no iPhone), continue o que você estava fazendo até a pessoa (?) chegar, ou comece a arrumar a mesa. Quando acidentalmente seus olhos se cruzarem com os do interlocutor, faça cara de que não está dando muita atenção. E, claro, depois fale algo que não tenha qualquer relação com o assunto.

No mais, nunca se esqueça: se tudo mais falhar, a sua empresa não quebrou ou faliu, só está passando por uma "reestruturação".

Fonte: Revista EU MESMO LTDA.

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Traduzindo o mundo corporativo
Como se tornar o empregado do mês
O que o seu chefe (não) deve entender... 
Prezado RH, (ou: Seção de Cartas)
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Profissões sem desemprego

3 comentários:

  1. DEMAIS, JORGE! Dicas profissionais. Se eu fosse chefe, as usaria.

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  2. Nossa... minha ex-chefe deve ter lido esse post. Eu fui um recorde e aguentei 8 meses na equipe dela. E não saí chorando!

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    1. Hehehehehehe... Pois é, Strelazul. Eles são mais comuns do que se pensa, infelizmente. O jeito é aprender a rir dessas situações (e/ou fazer um blog). Obrigado pela leitura. Volte sempre e fique à vontade para recomendar aos amigos.

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